No Irã, Mah Mooni só poderia ser segunda voz de cantores homens e, no Brasil, encontrou liberdade para construir sua carreira.
A iraniana Mah Mooni, 42 anos, sempre teve o sonho de ser cantora. Mas, se continuasse no Irã, não poderia realizá-lo. Pelas leis do seu país de origem, ela só poderia cantar como segunda voz de homens ou em coral com outras mulheres; nunca por conta própria e profissionalmente.
Determinada a lutar pela sua liberdade, Mah deixou o Teerã em 2012, quando chegou ao Brasil com o marido, Ali Entezari, 46. “Eu vim ao Brasil em busca de viver como uma mulher livre”, diz. “As mulheres no Irã não podem escolher as suas roupas para sair de casa, a sua profissão, fazer decisões para a sua vida… É muito pesado”, complementa.
Formada em filosofia, Mah Mooni refez os seus documentos de identidade na cidade de São Paulo, onde ainda mora, com o apoio da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR). “Foi a primeira coisa que eu fiz. Recomecei a minha vida do zero, sem nem saber o idioma. Foi muito difícil”, relembra.
Mah Mooni contou com apoio do ACNUR para renovar os documentos quando chegou ao Brasil, em 2012 © Arquivo pessoal
Jornada até realizar sonho não foi fácil
A mais de 12 mil quilômetros de distância do Irã, Mah teve que lidar com outros desafios. Sem entender e falar português, encontrou uma forte barreira linguística. Além disso, sua música persa não interessava aos brasileiros, que no máximo ouviam canções em inglês, além das nacionais.
“Foi muito desafiador, nenhum produtor queria abrir as portas para mim. É difícil mostrar a sua arte quando ninguém a conhece, é uma cultura muito distante do Brasil”, afirma.
Três anos se passaram sem que Mah tivesse a chance de seguir o sonho de finalmente se tornar cantora. A frustração só chegou ao fim quando começou a enxergar o desconhecimento acerca da sua cultura como uma oportunidade: ela seria a responsável por mostrar ao país que a acolheu a beleza da sua música e idioma natais.
“Entendi que eu poderia usar isso para crescer. Como uma das únicas artistas iranianas que vivia aqui, achei um lado bom: o Brasil vai conhecer a cultura persa comigo, eu vou apresentar a minha música para brasileiros, como pioneira”, comemora.
“Sem cantar, a minha vida não vale nada. Fazer música é a minha respiração.“
Mah Mooni, cantora refugiada iraniana vivendo no Brasil
Em 2015, Mah começou a fazer apresentações solo e publicar vídeos cantando nas redes sociais. Depois, formou uma banda própria, a Kereshme. Hoje, tem suas próprias canções e integra, desde 2017, os grupos Brisa do Oriente e a Orquestra Mundana Refugi – projeto multicultural apoiado pelo ACNUR que agrega refugiados e migrantes de diversas nacionalidades por meio da música e da dança.
“Eu vim ao Brasil em busca de viver como uma mulher livre”, afirma Mah Mooni, refugiada iraniana. ©Arquivo Pessoal
Perdeu a perna aos 14 anos e hoje é modelo no Brasil
Mah Mooni também passou a se sentir mais confiante em relação ao seu corpo no Brasil. Vítima de um acidente de trânsito aos 14 anos, Mah tem a sua perna esquerda amputada. Aqui, tornou-se modelo de moda inclusiva e admira mulheres com diferentes corpos usando roupas de banho na praia.
“Quando ando na rua com muletas, isso não é mais pesado para mim. No Irã, não é bom para uma mulher ter deficiência; você tem que esconder o seu corpo. No Brasil, vejo mulheres na praia sem medo de expor o seu corpo real. Aqui, posso mostrar a minha beleza, que é diferente”, observa.
Atualmente, Mah vive com os volumosos cachos do seu cabelo loiro soltos e usa vestidos acima do joelho, que a deixam exibir com orgulho a sua prótese. O seu lugar preferido em São Paulo é o Sesc Pompeia, onde se apresenta com frequência nos teatros do local.
Apesar das oportunidades que encontrou no Brasil, Mah Mooni lamenta o que teve que deixar para trás. “Eu não posso voltar para o Irã, não posso visitar a minha família, meu pai, a minha irmã. Vivo com saudade”.
Mas a sua resiliência não deixa que ela perca a esperança de crescer ainda mais no seu novo país, onde vive liberdades profissionais e pessoais que não poderia ter no Irã.
ACNUR oferece proteção às mulheres e meninas em todas as etapas do deslocamento forçado ©ACNUR/Felipe Irnaldo
O Acnur e as mulheres refugiadas
Globalmente, as mulheres refugiadas representam cerca da metade das 114 milhões de pessoas forçadas a se deslocar, mas os desafios que enfrentam são, muitas vezes, desproporcionalmente maiores. Mesmo assim, ao serem forçadas a sair de suas casas, movem mundos inteiros para sobreviver e construir uma vida melhor para si, suas comunidades e famílias.
A discriminação contra as mulheres e meninas é causa mas também consequência do deslocamento forçado e da apatridia. Muitas vezes, a situação é agravada por outras circunstâncias, como a origem étnica, deficiências físicas, religião, orientação sexual, identidade de gênero e origem social.
Os caminhos que as mulheres percorrem em busca de refúgio são repletos de riscos. Elas são expostas à violência sexual, física e psicológica, incluindo a exploração sexual e laboral cometida por grupos criminosos ou até mesmo pessoas de sua comunidade. Geralmente, enfrentam os perigos de longas jornadas para chegar a um lugar onde possam viver sem violência.
O ACNUR oferece proteção às mulheres e meninas em todas as etapas do deslocamento forçado para promover sua integração sustentável e solidária nas comunidades que as acolhem.
Fonte: ACNUR/ONU.