A Forbes nomeou Jordan Belfort, o ambicioso corretor da bolsa de valores de Nova York, como ‘O Lobo de Wall Street’, mas seria essa a melhor definição para o fundador da Stratton Oakmont?
O distrito financeiro de Nova York permanece como sempre. Repleto de engravatados focados nas mínimas oscilações da bolsa de valores, de corretores que não se importam com nada além do dinheiro e dos mais variados tipos de pessoas, que só se igualam em um único ponto: o desespero em ganhar, ganhar e ganhar mais um pouco.
Ninguém na rua nota um imponente lobo, peludo e cinzento, que avança com passadas tranquilas no meio da multidão. As íris amendoadas do animal carregam uma serenidade que não pode ser encontrada nos olhos dos homens que correm para suas reuniões e telefonemas importantes.
Com a destreza de um pequeno gato, o Lobo desvia de qualquer esbarrão. Não que importe, os humanos não podem vê-lo ou senti-lo. Entediado em seu caminho pré-traçado, o animal analisa o cenário ao seu redor: a rua, as pessoas… o Lobo está cansado das mesmas expressões, a mesma arquitetura monótona dos prédios, o incessante burburinho de vozes e os mesmos tons cinzentos. Nada em Wall Street o agrada. Sua curiosidade é a razão para estar presente nesse local sem alma.
Não! Salvo engano, a alma aqui é trina: dinheiro, poder e luxúria. É esse o conjunto mais puro, a essência base para formar os indivíduos que caminham pelas movimentadas ruas da bolsa de valores de Nova York.
As grandes patas param de se mover ao chegar em um dos muitos gigantes cinzentos. Ele sabe que esse é o certo, seu faro não o engana. O edifício amplo o recebe e, sem qualquer problema, as portas do elevador abrem-se para o animal. A luz indicando o último andar pisca. Eles sempre preferem a cobertura, é claro. “Quando mais alto, maior o tombo”, reflete o Lobo, encarando a superfície espelhada do elevador.
As portas abrem-se e uma recepção adentra seu campo de visão. O logo Stratton Oakmont chama atenção, um leão é o ícone escolhido. “Curioso”, ele pensa.
O piso frio incomoda ao entrar em contato com as patas fofas quando o animal cinzento caminha em direção ao escritório da corretora de ações fundada por Jordan Belfort.
Quando chegou em Wall Street, o jovem Belfort era um rapaz ingênuo e sonhador, que almejava construir uma carreira honrada como um grande corretor de ações. De forma rápida, sua inocência se perdeu e ele foi corrompido por suas aspirações: poder e dinheiro. A carreira honrada foi construída sobre mentiras e golpes, seus ideais foram esquecidos. Agora, Jordan Belfort é o líder de um grupo composto por pessoas que o admiram e querem ser como ele, independentemente do caminho que precisem seguir.
Ao adentrar o escritório, o focinho escuro consegue captar o cheiro de álcool, tabaco, sexo e drogas. Os corretores, empolvorosos, estão atentos ao discurso que Jordan Belfort faz em um palanque.
A cena absurda e intrigante detém a atenção do Lobo.
“E para começar com nosso deboche semanal, eu ofereci a nossa adorável assistente de vendas, Danielle Harrison, 10 mil dólares para ela raspar toda a cabeça!”, a voz de Belfort ressoa na ampla sala.
Todos no escritório gritam animados com a ideia. A mulher, que agora o Lobo nota, está sentada na lateral do palco e parece nervosa, mas disposta ao desafio.
“Vamos escalpelar! ESCALPELAR!”
A multidão alucinada grita “vai, vai, vai” e com esse coro a máquina percorre o couro cabelo da assistente. Os fios caem no chão, mas ela não liga. Os 10 mil dólares são seus.
“Essa é uma empresa incrível ou não é?!”, Jordan indaga aos funcionários, com um grito animado.
O coro cresce e torna-se quase impossível ouvir o que Jordan Belfort diz. O Lobo percebe que, mesmo esses homens, que pareciam prestar atenção ao discurso, agora estão em um transe tão profundo e maníaco que não faz diferença para eles ouvir o que é dito. Estão entregues a um instinto desconhecido pelo animal cinzento.
“PODE COMEÇAR A INCENDIAR ESSA PORRA TODA AGORA!”
Das portas laterais do escritório, uma banda entra tocando, com direito a coreografia, trompete, tambor, saxofone, o aparato completo. E todo mundo está seminu. O Lobo não pode acreditar no que está vendo. Se o discurso já parecia absurdo, isso era inimaginável.
E é só o começo.
Uma quantidade infinita de garçons entra pelo mesmo caminho, distribuindo taças de champanhe aos montes. O animal nem consegue perceber como surgiram as ginastas, mas elas já estão em cima das mesas, com seus maiôs vermelhos, exibindo seus movimentos e flexibilidade.
Jordan Belfort está na multidão, feliz, dançando e admirando sua festa.
“Que entrem as strippers!”, ele grita.
Mais de uma dúzia de mulheres de lingerie entram pelas laterais e, em menos de um minuto, o local se transforma em uma boate. As luzes piscam e confetes caem nos corpos seminus. Os corretores agarram, beijam e carregam as strippers no colo pelo escritório. Há mulheres em cima das mesas e homens lutando no chão. O Lobo percebe que é uma questão de segundos para que todos estejam entregues aos drinks e comecem a acasalar em público, sem pudor. Como animais.
Animais.
Sim, agora ele percebe, é isso que tem visto desde que chegou a Wall Street. Homens e mulheres entregues ao instinto mais animalesco que o Lobo já havia presenciado. Diziam que Jordan Belfort era um lobo e que em sua matilha se encontrava gente da pior espécie. O Lobo estava curioso para conhecer o homem que detinha esse título, afinal, lobos são animais espertos, inteligentes e estratégicos. Para muitos, essa era a síntese do criador da mais promissora corretora de ações de Nova York.
O Lobo discordava. Jordan Belfort e seus companheiros eram os animais mais primitivos que ele já vira. Eram seres humanos.
Autora: Bárbara de Aguiar.
Fonte: Jornalismo Júnior/USP.