À espera de descobertas: a vinda de profissionais de comunicação nordestinos para SP

A vida e os desafios encontrados pelos nordestinos que se deslocam até São Paulo em busca de melhores oportunidades de emprego na área da comunicação.

São Paulo atrai pessoas de todas as regiões do país e do mundo, afinal, a cidade é o maior centro econômico e financeiro do Brasil. Grande parte desse público é de nordestinos, que, durante o período da colonização, chegaram no Sudeste para trabalhar em áreas como a cafeicultura, mas hoje já chegam para dominar os mais amplos e importantes setores trabalhistas da região, como é o caso do setor de comunicação. 

Andriele Morais, especialista de comunicação em redes sociais da empresa FSB Comunicação, nascida no sertão de Pernambuco, decidiu se aventurar na capital paulista. Ela conta que sua cidade tinha poucas oportunidades de emprego e de estudo, “tem 20 mil habitantes, não existe uma faculdade ou universidade perto. É uma uma educação baseada no Ensino Médio, com poucas escolas, poucas opções de onde estudar e de onde trabalhar. Começa do fator educacional até o mercado de trabalho, sem muitas oportunidades, diferente de São Paulo, que você encontra várias editoras, grandes veículos de notícia e até uma estrutura arquitetônica que colabora para sua grandiosidade”.

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Andriele Morais, especialista de comunicação em redes sociais.
Acervo pessoal

MERCADO DE TRABALHO       

É pensando no vasto mercado de trabalho, nas grandes propostas salariais e no destaque dos profissionais da comunicação locais, que muitos nordestinos se deslocam até a capital paulista para estudar trabalhar no ramo. “Há muitas oportunidades aqui, pela quantidade de empresas que estão em São Paulo, pelos caminhos diferentes de carreira que se pode percorrer. Desde trabalhos em agências, possibilidades de empreendedorismo, até oportunidades de trabalho em grandes organizações multinacionais que estão baseadas aqui, tudo isso é muito atrativo”, afirma Higor Lopes, piauiense e coordenador de marketing da Unilever Brasil, em São Paulo. 

As múltiplas oportunidades acabam por criar uma polarização de informações, concentradas especialmente na cidade de São Paulo, chamando a atenção dos comunicadores que desejam crescer na área. “É a parte principal econômica e política do país, as coisas acontecem aqui. Conseguimos desdobrar assuntos nacionais com facilidade porque tem uma abrangência muito grande de veículos, tem todas as emissoras de TV, de rádio, podcasts famosos, redação, estúdio. Eu vejo uma facilidade em acessar conteúdos daqui e uma dificuldade em acessar conteúdos do Piauí”, explica Thamires Brito, piauiense e diretora executiva da CNN Brasil, em São Paulo.

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Thamires Brito, diretora executiva da CNN Brasil.
Acervo pessoal

O principal polo econômico do país gera mudanças positivas na carreira dos profissionais que buscam a comunicação. “Meu projeto inicial da CNN era com especialistas, um deles era o maestro João Carlos Martins, referência para a nossa cultura clássica. Nosso trabalho era muito direto, eu que aprovava as sugestões dele, fazia de uma forma para ficar mais jornalística. Acabamos por desenvolver uma amizade e ele me proporcionou entender mais sobre música clássica. Passei a estudar esse conteúdo, até para ter mais assunto com ele. Ainda hoje vou para os concertos do maestro”, completa Thamires.

A polarização prejudica também na questão da diferença da educação entre os dois territórios, uma vez que aqueles estudantes que moram em um dos dois polos, consequentemente terão mais contato com maiores notícias, melhores estágios e um melhor ensino. Ana Kezia de Andrade, aluna da PUC-SP e estagiária no SBT, aponta essas diferenças ao conversar com os amigos de sua cidade natal, Teresina. “Às vezes o que acaba faltando mesmo é o contato com algumas pautas que você pode ter aqui, com os maiores nomes da área daquele assunto, que tem dimensões maiores. Em relação aos estágios, eu percebo que a desigualdade salarial é muito grande”.

Em contrapartida, muitos nordestinos lamentam a mentalidade cultural que impõe o Nordeste como um local sem capacidade produtiva, baseada em equívocos, visto que, os recursos da região Nordeste também são responsáveis pelo desenvolvimento do país. “Eu considero sim, que isso é extremamente prejudicial para o nosso país, até porque essa visão que coloca o Sudeste no centro de tudo é exatamente o que cria essas concepções e perpétua esse ciclo de pessoas que já estão ali. Sempre temos essas barreiras a enfrentar e desmistificar”, completa Higor. 

PRECONCEITO

Outra questão bastante presente na vida dos comunicadores nordestinos é o sotaque. Devido a pluralidade brasileira, naturalmente as pessoas das regiões sul e sudeste desconhecem muitas das expressões utilizadas, e, por conta disso, muitos nordestinos sofrem preconceito, passam por situações constrangedoras e acabam entendendo que possuem a obrigação de mudar sua forma de falar, para ganharem mais reconhecimento. “O que eu percebo bastante, é que às vezes em alguns trabalhos de áudio, pediam para que eu diminuísse o meu sotaque ou ficavam rindo de algo que eu falava. E eu ficava sem entender a graça” declara Ana Kezia.

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Ana Kezia, estudante de jornalismo.       
Acervo pessoal

A xenofobia presente na vida dos nordestinos é bastante notória também no cotidiano dos trabalhadores efetivos da comunicação, pois, muitos profissionais são julgados pelas suas origens. “Um episódio que eu lembro que me causou uma crise de choro no trabalho, foi quando eu trabalhava em uma empresa de aviação atendendo os clientes e no momento em que um determinado cliente percebeu meu sotaque baiano, me destratou, desligou e pediu para ser atendido por outra pessoa. Depois, minha chefe paulista me comunicou que a situação ocorreu por conta da minha origem, ele não queria ser atendido por uma baiana” relata a jornalista Maristelly de Vasconcelos, natural de Feira de Santana. 

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Maristelly de Vasconcelos, jornalista.
Acervo pessoal

Atuar na área da comunicação, em São Paulo, é o sonho de muita gente e para seguir esse caminho é necessário persistência. “Eu convivo com gente de todas as idades na redação e eu percebo uma dificuldade nas pessoas mais novas em contextualizar fatos, em aprofundar um assunto. É obrigação de qualquer jornalista assistir jornal todo dia, acessar os principais sites do Brasil e do mundo ou até mesmo se informar por redes sociais. Se informar não é só se impactar com o agora, mas entender o contexto histórico e político da situação. Fazer curso de idiomas e ter um inglês fluente é muito importante também”, finaliza Thamires. 

Autores: Malu Lopes e Rhuan Teixeira.

Fonte: Cásper Líbero.