Criadores de conteúdo esportivo crescem cada vez mais na plataforma de vídeos curtos. Mas, afinal, é possível fazer jornalismo esportivo no TikTok?
As redes sociais são uma das maiores evoluções midiáticas, um espaço antes designado para postagem de fotos, mas hoje visto também como um dos melhores meios para produzir conteúdo na internet. Entre os pioneiros estão o Orkut, rede inativa atualmente, o Facebook, o Instagram, o Twitter e a mais nova explosão, o TikTok. Este app, que para alguns é recente mas está no ar desde agosto de 2014, antes era conhecido como Musical.ly, um aplicativo desenvolvido inicialmente apenas com o intuito de dublar músicas e frases icônicas da internet. Hoje, o aplicativo, que mudou de nome para TikTok, vive um momento de ascensão, se tornando um dos principais meios de entretenimento no mundo.
O TikTok se popularizou pelas tradicionais coreografias que seus usuários criavam para determinadas músicas, mas hoje, graças ao fácil acesso aos recursos de gravação e edição que o app disponibiliza, a rede se tornou alvo para produzir, além do entretenimento, conteúdo jornalístico fora das grandes mídias, como emissoras de TV. Alguns jovens encontraram no aplicativo uma maneira de repassar informações e divulgar notícias pelo seu próprio celular, e com um formato diferente dos tradicionais, isso porque a maioria dos vídeos conta com aproximadamente um minuto a um minuto e meio de duração. Recentemente a plataforma liberou a produção de vídeos de até dez minutos, mas o aplicativo conta com certa “fórmula perfeita” para se popularizar: vídeos curtos, leves e dinâmicos.
Os criadores de conteúdo decidiram informar as pessoas da maneira mais rápida e acessível possível, maneira já conhecida entre os jornalistas da velha guarda: as Breaking News, termo inglês para “últimas notícias”, que se popularizaram junto com os canais por assinatura e TV aberta. Essa era uma maneira de transmitir uma notícia de última hora, muitas vezes interrompendo ao vivo a transmissão. O avanço da tecnologia e o fácil acesso às notícias no celular enfraqueceram esse monopólio da televisão, mas ainda existe uma resistência em acessar as notícias por esses novos aplicativos.
Aqui se inicia nosso processo de pesquisa, onde buscamos encontrar a resposta para a seguinte pergunta: é possível produzir jornalismo — especificamente esportivo — dentro do TikTok? O processo dessa resposta foi dividido em algumas etapas. O primeiro foi uma coleta de dados rápida, na rua, mesmo, com pessoas de diferentes faixas etárias e que estavam dispostas a responder rapidamente se era possível produzir conteúdo jornalístico para o app.
O resultado foi majoritariamente que sim, é possível. De sete entrevistados, cinco responderam a favor do conteúdo produzido no app, já os outros dois, membros da chamada “velha guarda”, deram respostas um pouco diferentes… Márcio, 55 anos, respondeu a pergunta da seguinte forma:
“Olha, o TikTok é para brincadeira, jornalismo sério não tem como, não”.
Cibele, 49 anos, esposa de Márcio, decidiu responder um pouco mais exaltada:
“Esse TikTok só tem porcaria, só tem coisa que não presta! Jornalismo de qualidade não vai ter no TikTok com certeza”.
Mas será que essa “velha guarda” tem razão? Ou a maioria dos entrevistados vai pensar diferente? A única forma de encontrar uma resposta é entrevistar quem realmente entende sobre o assunto. Sendo assim, fomos atrás de três professores da Faculdade Cásper Líbero que não apenas vivem o jornalismo como ensinam para a geração atual o que é o jornalismo e como ele é produzido. Os escolhidos para responder nossas perguntas foram os professores Fábio Ciquini e Ariovaldo Vicentini, de fotojornalismo, e a coordenadora dos cursos de pós-graduação, Marli Santos. A pergunta era básica, em poucas palavras: “O que é o jornalismo?”:
“Jornalismo tem a ver com um serviço, informação, a partir de um conjunto de técnicas e que interessam a um grande público, a maioria das pessoas.”
(Fábio Ciquini)“É difícil essa pergunta, né? Mas eu posso dizer, à luz de Odelmo Filho, que jornalismo é uma forma de conhecimento do mundo assim como a Ciência, a Arte e portanto necessita de parâmetros, formas de apuração e de uma série de critérios que vão estabelecer essa atividade, como uma forma de conhecimento”
(Marli Santos)“Jornalismo é a atividade ou a técnica de identificar coisas, notícias que são relevantes para a sociedade.”
(Ariovaldo Vicentini)
Agora que deu pra entender um pouco mais sobre o que é o jornalismo, vamos aprender também um pouco mais sobre a plataforma TikTok. Para isso, entrevistamos a também jornalista Fernanda Teles, formada pela ECA-USP, que foi responsável por escrever uma matéria para a revista eletrônica Babel sobre o TikTok, em dezembro de 2020 (http://www.usp.br/babel/?p=267). Além de produzir um material muito completo sobre a plataforma, Fernanda acabou estudando o fenômeno do boom do TikTok. Ela afirma:
“Eu acredito que o boom do TikTok ocorreu por diversos motivos, mas um dos principais foi com certeza a pandemia. O fato da gente estar em casa 100% do tempo fez a gente se entreter, distrair de alguma maneira, então a gente estava mais propenso a consumir o tipo de conteúdo que o TikTok tem. Além disso, a gente estava um pouco saturado das outras redes sociais, como Instagram, Facebook e Twitter. Sem falar que essa geração atual consome o conteúdo de uma forma muito rápida, exatamente do jeito que o TikTok propõe, pois os vídeos são super-rápidos e dinâmicos”.
Com isso, a próxima pergunta é a pergunta-chave do nosso projeto: mesmo com tudo que o TikTok nos proporciona, é possível produzir jornalismo dentro dele?
Acredito que já deu pra entender bastante sobre jornalismo, sobre a plataforma TikTok e até mesmo sobre como podemos linkar esses dois. Buscando nos aprofundar mais no conteúdo produzido no TikTok (e aqui, especificamente, esportivo), decidimos conversar com Anna Beatriz (ou Anninha), parceira de criadores dentro do TikTok. Mais especificamente, Anninha é responsável pela ligação futebol-TikTok.
Ou seja, ela é a responsável por fazer a ponte entre criadores de conteúdo, atletas, figuras públicas do meio esportivo e a plataforma. Consequentemente, atua na área de marketing, pensando em como e que tipos de propagandas podem ser realizadas entre o mundo do esporte e a plataforma. Entre essas parcerias podemos citar a mais famosa delas, com a Conmenbol Libertadores, quando a marca presenteou dois criadores (Kaike e Jhon) com ingressos para a final de 2021 em Montevidéu, no Uruguai.
Deu para ver a incrível função que a Anninha exerce, né? Por isso nosso grande Kaike Nagai foi até o Rio de Janeiro para entrevistá-la. Se liga no que a entrevista rendeu:
Kaike: O nosso trabalho é relacionado com jornalismo, futebol e TikTok. Queria saber como você vê a relação dessas três coisas.
Anninha: Eu acho que essa relação está cada vez mais próxima, a gente viu que novas maneiras surgiram, novas formas de fazer jornalismo, e o TikTok é uma delas. A gente tem atraído cada vez mais jornalistas esportivos para dentro da plataforma, tem muito futebol, claro, é o esporte mais popular do Brasil. Então não podia ser diferente. Então, Kaike, eu acho que TikTok, futebol e jornalismo se completam, porque TikTok é uma nova maneira de fazer jornalismo, uma maneira muito mais rápida e dinâmica, apesar de a gente estar disponibilizando cada vez mais tempo de vídeo. Eu acho que os três se complementam dentro da plataforma.
Kaike: Agora eu gostaria de saber como a relação dos três favorece o seu trabalho para atrair mais marcas e campanhas para o aplicativo.
Anninha: Eu acho que as marcas têm muito interesse em conteúdo de qualidade e elas têm muito compromisso com a verdade no conteúdo também, então quando a gente tem jornalistas esportivos, principalmente em um meio apelativo igual o futebol, que têm um compromisso com a verdade, as marcas se sentem mais atraídas por isso, porque a gente tem esses valores que elas buscam dentro do app. Então essa questão de verdade, de qualidade de conteúdo, então quando junta os três é sucesso.
Depois de entrevistar pessoas na rua, os professores da Cásper, uma especialista das redes sociais e, por fim, a responsável pela ponte TikTok — futebol, acreditamos que ainda falta entrevistar alguém que esteja envolvido em todos esses aspectos. Nada melhor do que alguém que produz jornalismo, focado em esportes e usa rede social (no caso, o TikTok) para produzir conteúdo. Sim, um mix de tudo. Os nomes escolhidos? Braune (tiktok.com/@brauneoficial) e Victor Canedo (tiktok.com/@vcanedo88).
Ambos são muito conhecidos pela geração TikTok, mas com histórias completamente diferentes, começando pelo Braune (sobrenome de Daniel Braune), carioca e torcedor fanático do Botafogo que cresceu muito dentro do TikTok ainda quando esse conteúdo de futebol não era muito explorado. Apresenta um conteúdo futebolístico muito completo, mas não esquecendo seu lado torcedor. Com conteúdos dinâmicos, Braune foca muito no uso da tela verde (recurso do TikTok que a gente ensina a usar no nosso vídeo produzido para o app) e produz um excelente conteúdo jornalístico focado para todas as faixas etárias. Acho que já deu pra conhecer bem o nosso próximo entrevistado.
Muitos jornalistas esportivos decidiram migrar para o TikTok, e encontram nele uma oportunidade de dar sua opinião se desprendendo das emissoras em que trabalham ou trabalhavam. Um desses jornalistas foi Victor Canedo. Graduado em jornalismo desde 2010, ele começou como estagiário no site GE, espaço esportivo da Rede Globo, e após a Copa do Mundo de 2010 foi efetivado, se especializando em futebol internacional. Canedo, como é conhecido na internet, costumava manter sua carreira por trás das câmeras, mantinha seus perfis nas redes sociais fechados e era ativo somente no Twitter.
“Bom, cara, eu era um cara bem avesso às redes sociais, a única rede social que usava muito era o Twitter, e acho que isso é muito do jornalista, tem muito de usar o Twitter, porque é lá que está a notícia, vai chegar antes, e te dá a oportunidade de interagir com outros jornalistas importantes por lá.”
Em maio de 2021, o jornalista pediu demissão e decidiu seguir uma carreira solo no mundo digital. Essa mudança trouxe a Canedo novas oportunidades, o mundo digital tem muito a ser explorado, é um meio de comunicação muito indicado para a sociedade atual, que vive em busca de praticidade. Além disso, as ferramentas de edição que o TikTok dispõe favorecem os criadores de conteúdo, que começam a se desprender dos textos e migram para um outro formato de transmissão da informação, os vídeos.
“Hoje é muito mais fácil um vídeo fisgar alguém do que um texto , muito pelo celular, que hoje em dia as pessoas não ficam sem.”
O entrevistado relatou também que o TikTok é uma plataforma instável, não tem um assunto que é certo que vai viralizar. Os produtores se baseiam de acordo com o retorno dado pela audiência, ou seja, para se adaptar com o aplicativo, é necessário que você saiba transitar nas trends da rede. As trends que mais fazem sucesso nas redes caminham junto a assuntos e pessoas polêmicas da internet, como a rivalidade de Cristiano Ronaldo e Messi e a Seleção Brasileira (principalmente em ano de Copa), entre outros.
Canedo explicou que costuma trabalhar com temas que geram debate entre o público porque as interações dos seguidores, seja com curtidas ou comentários, geram engajamento para a postagem e aumentam o alcance da publicação. E, por fim, foi o momento de conscientizar os jovens que estão começando a produzir conteúdo.
“Eu sou superafavor do casamento entre informação e entretenimento, eu consumo muito isso, mas eu acho que tem que ter esse compromisso sim, ficar atento, principalmente a “molecada” que tá começando agora. Pegue o caminho certo, pegue o fato, porque eu vejo muita gente, principalmente as páginas que a galera não mostra o rosto, com muitos vídeos que abusam das fake news para chamar a atenção do público.”
Esses novos vídeos despojados e dinâmicos começaram a tomar conta do ramo do entretenimento e, para a gente não ficar de fora, mostramos para você um pouco desse “novo jornalismo”.
Autores: Fernano Mainardi, João Bechere, Kaike Nagai e Ygor Boniciello.
Fonte: Cásper Líbero.