Sequência de Fibonacci: um olhar da natureza a partir dos números

A matemática está em todos os lugares no nosso mundo, até em pequenos detalhes como as pétalas de uma flor.

Seja por ter visto filmes de mistérios conspiracionistas como Código Da Vinci ou por tê-la estudado em suas aulas de Álgebra, você provavelmente já ouviu falar da sequência de Fibonacci. Uma progressão numérica especial que intriga muitas pessoas por sua beleza e seus mistérios. Mesmo com diferentes histórias de origem e mitos que circulam, a sequência vai muito além de um conjunto de meras coincidências do mundo natural. Mas o que ela é exatamente? Neste texto do Laboratório, você vai poder conhecer um pouco mais sobre como essa sequência funciona e o porquê dela chamar tanta atenção do ser humano para o universo ao seu redor.

O que é a Sequência de Fibonacci?

A sequência de Fibonacci não é nada mais que uma sucessão bem específica de números: ela é infinita e consiste na ideia de que qualquer número da sequência sempre será formado pela soma dos dois anteriores. Dessa forma, começando pelo número um, ele é seguido por um (soma do zero mais um), e assim por diante:

{1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 34, 55, 89, 144, 233…}

O motivo dessa sequência matemática ser tão intrigante é que ela pode ser encontrada em vários fenômenos da natureza e em várias áreas do conhecimento como na matemática, na física, na arte, na arquitetura e no design.

Os primeiros números

A primeira menção da sequência nos registros da história ocidental foi feita pelo matemático italiano Leonardo de Pisa (1170 – 1250), também conhecido como Fibonacci. No ano de 1202, ele publicou sua maior obra, Liber Abaci (Livro do Ábaco ou de Cálculo), em que apresenta a demonstração da sequência de Fibonacci a partir de um estudo sobre a evolução da população de coelhos. 

Gravura de autoria desconhecida do matemático Leonardo de Pisa.
[Imagem: Reprodução / Wikimedia Commons]

Desconsiderando fatores biológicos reais, o problema é proposto da seguinte forma: um casal de coelhos demora dois meses para atingir a idade fértil e, quando atinge essa idade, se reproduz, sempre originando mais um casal, e assim o processo se repete. A pergunta feita pelo matemático foi a respeito de quantos casais de coelhos existirão ao final de um ano.

A partir da ideia ilustrada no esquema abaixo, Fibonacci concluiu que a quantidade de casais de coelhos cresceria seguindo uma mesma ordem, e a sequência infinita gerada pelos números de casais obtidos em cada mês decorrido seria formada pela soma dos dois números anteriores. Aí se anunciava a célebre sequência que, posteriormente, seria nomeada em homenagem a um dos mais importantes matemáticos europeus da Idade Média.

A progressão de nascimento de casais de coelhos segue a sequência de Fibonacci.
[Imagem: Produção/Diego Facundini]

Natureza organizada

O que torna a sequência de Fibonacci tão interessante é que ela pode ser encontrada em diversos cantos da natureza, das formas mais variadas. Uns dos exemplos mais conhecidos são as pétalas de flores: espécies como o girassol e a margarida apresentam variações no número de pétalas seguindo os valores da sequência. 

Outro caso são as árvores genealógicas de zangões de espécies de abelhas produtoras de mel, chamadas melíferas. A reprodução deles é feita a partir da partenogênese, ou seja, sem a inserção do material genético do macho. Assim, é possível dizer que todo zangão só teria “mãe”, essa que, diferentemente, foi gerada pela união do material genético do macho e da fêmea. Seguindo essa lógica, ao se construir uma árvore genealógica de um zangão, poderá se observar que o número de seus ancestrais aumenta na proporção da sequência de Fibonacci. 

Cláudio Possani, professor do Instituto de Matemática e Estatística (IME) da Universidade de São Paulo explica que isso acontece “porque muitos fenômenos biológicos ocorrem por ciclos”. A organização das sementes das pinhas, o crescimento de ramos e troncos de algumas espécies de plantas, o arranjo da espiral do abacaxi e até a estrutura de galáxias são outros fenômenos naturais que apresentam relações com a famosa progressão numérica.

Há muitos casos na natureza em que a sequência de Fibonacci pode aparecer. [Imagem: Montagem de Fernanda Zibordi/ Alexas_Fotos, Pixabay; NoName_13, Pixabay; Stephany Willians, Unsplash; Kevin Brown, Flickr]

“Cada vez que ocorre um fenômeno deste tipo, em que a quantidade de objetos num ciclo depende dos dois ciclos anteriores, vamos encontrar a sequência. Por isso que em muitas flores o número de pétalas que encontramos é um número da sequência”, diz o professor.

1,6180339887…

Os termos da sequência de Fibonacci também possuem relação direta com o chamado número de ouro, que pode ser encontrado em diversas obras artísticas e arquitetônicas. Simplificando bem, quando dividimos um número da progressão pelo imediatamente anterior, o resultado será cada vez mais próximo do valor 1,618… à medida em que se avança na sequência. 

Esse valor, um número irracional e infinito, é representado na Matemática pela letra grega phi (φ), em homenagem ao escultor grego Phidias, que teria  utilizado bastante o número de ouro, também chamado de proporção áurea, em seus projetos. É com essa mesma proporção que pode ser montado o conhecido retângulo áureo, esse muito utilizado no mundo da arte por ser considerado esteticamente agradável aos olhos. 

A espiral presente dentro do retângulo áureo é infinita e segue a proporção do número de ouro.
[Imagem: Reprodução/ Gerd Altmann, Pixabay] 

Pintores do Renascimento, como Leonardo da Vinci, possuem pinturas em que a proporção áurea pode ser encontrada, sendo os exemplos mais famosos Mona Lisa A Última Ceia. Para Claudio, parte da beleza da Matemática está nisso: “tudo que é importante, fundamental, se conecta com outros aspectos. A Matemática é um corpo integrado de conhecimentos”.

A sequência de Fibonacci é muito utilizada na arte por trazer a ideia de harmonia.
[Imagem: Reprodução/ Michael Paukner, Flickr] 

Tá, mas o que fazemos com isso?

Apesar dessas aparições tanto na natureza quanto na arte, resta a dúvida a respeito da real utilidade da sequência em nosso cotidiano. E sim, ela pode ser encontrada em muitos elementos do nosso dia a dia que nem sequer paramos para pensar. “A sequência de Fibonacci aparece em coisas muito curiosas, como em reflexões de ondas de luz”, diz Ricardo Miranda, professor e diretor do Instituto de Matemática, Estatística e Computação Gráfica da Unicamp (IMECC). 

“Quando se tem uma luz refletindo em um meio como, por exemplo, em fibras ópticas chegando até a nossa casa, a quantidade de reflexões que o raio vai sofrer na fibra óptica tem uma relação bastante interessante com a sequência de Fibonacci: basicamente, o número de caminhos que o raio percorre é dado pelos termos da sequência”, diz o professor. 

Stephanie Nietto, licenciada em Matemática pela Unicamp, comenta que ela pode ser usada no mercado financeiro para guiar tomadas de decisões, como também pode aprimorar a forma como algoritmos de programação resolvem problemas.

Nem tudo o que reluz é ouro

Mesmo que a famosa sequência numérica tenha características deslumbrantes do ponto de vista matemático, existem diversos mal entendidos e mitos que giram em torno do assunto da sua descoberta, como também das suas propriedades. 

Há muitos indícios de que a sequência, na realidade, não foi descoberta por Leonardo Fibonacci com seus estudos de reprodução de coelhos. “Apesar dessa história lúdica e bastante explicativa, há artigos acadêmicos que indicam o uso dos números de Fibonacci já na matemática indiana medieval”, afirma Stephanie. Segundo historiadores, o matemático italiano tem como grande legado a introdução desses conhecimentos da matemática do oriente à civilização ocidental. 

A sua principal contribuição foi ajudar o desenvolvimento matemático da Europa ao popularizar no continente a noção dos numerais indo-arábicos, que substituíram os algarismos romanos e se tornaram a base do sistema numérico ocidental, utilizado até os dias de hoje. 

Outra questão é que, apesar de poder ser encontrada em diversos fenômenos naturais, a sequência de Fibonacci não se trata de uma lei regedora do universo ou um código secreto da natureza, como é difundido. Ainda que em muitas situações ela possa ser encontrada, há muitas outras que não seguem essa regra. 

“Apesar de admirável, a sequência de Fibonacci não consegue explicar a infinidade de fenômenos complexos que ocorrem na natureza e dependem de diversos outros fatores variáveis. Acredito que, uma sequência dada, inflexível e tão simples, não rege o mundo e, muito menos, toda a matemática”, diz Stephanie. Em sua avaliação, seria uma utopia ter explicações para tudo, principalmente em um campo tão complexo e ainda não totalmente explorado como o das exatas. 

Além disso, não há comprovações de que a proporção áurea seja a “essência da beleza”. Tratando-se de uma questão estética, é bastante subjetivo a ideia do que seria belo ou não. Para Miranda, essa ideia de beleza da sequência pode ser explicada pelo fato dos seres humanos acharem padrões simétricos bonitos e ficarem incomodados com assimetrias.

Ainda que seja possível encontrar diversas relações entre a belíssima sequência de Fibonacci e a realidade, elas são apenas algumas das incontáveis formas do Universo girar suas engrenagens.

Autora: Fernanda Zibordi.

Fonte: Jornalismo Júnior/USP.