Linha do tempo detalhada do caso Benício revela erros e suspeita de adulteração de prontuário após a morte da criança

Linha do tempo detalhada do caso Benício revela erros e suspeita de adulteração de prontuário após a morte da criança

A morte de Benício Xavier, de 6 anos, após a administração equivocada de adrenalina pela via intravenosa no Hospital Santa Júlia, em Manaus, chocou o país e gerou uma investigação complexa. O caso é marcada por depoimentos contraditórios, omissões, piora súbita do quadro clínico e indícios de adulteração do prontuário, segundo o delegado Marcelo Martins.

A seguir, uma reconstrução cronológica completa, com base em depoimentos, documentos e falas oficiais do delegado responsável pelo caso.


22 de novembro — início do atendimento

19h30 — Chegada ao hospital

Benício chega ao Hospital Santa Júlia acompanhado dos pais, com tosse seca, rouquidão e suspeita de laringite. Não havia sinais de gravidade extrema.

A equipe realiza a triagem e o caso é classificado como demanda clínica comum. Nenhum protocolo de urgência vermelho é acionado.


20h00 — primeiros procedimentos

O menino recebe:

  • lavagem nasal,
  • hidratação venosa,
  • xarope,
  • nebulização inicial,
  • e é avaliada a possibilidade de uso de adrenalina.

Até aquele momento, o atendimento seguia condutas compatíveis com o quadro, segundo a família.


20h30 — o registro que muda tudo

Neste horário, a médica Juliana Brasil Santos registra a prescrição de adrenalina pela via endovenosa, contrariando a prática habitual de nebulização em casos de laringite.

A prescrição, segundo a investigação, foi feita pelo sistema digital do hospital.

A técnica de enfermagem Raiza Bentes Paiva afirma ter seguido exatamente o que estava no prontuário eletrônico:

“Estava registrado no sistema. Eu apenas apliquei.”


20h30 a 22h00 — três doses em sequência

Benício recebe três doses de 3 ml de adrenalina intravenosa, com intervalo de 30 minutos.

Imediatamente após as aplicações, começam os sinais de deterioração clínica:

  • palidez intensa,
  • extremidades arroxeadas,
  • agitação,
  • queixa de dor no peito,
  • sensação de “coração queimando”.

O pai relata:

“Meu filho nunca tinha tomado adrenalina na veia. Perguntamos, e a técnica disse que nunca tinha aplicado desse jeito, mas que estava na prescrição.”

A saturação cai para 75%.


23h00 — ida para a Sala Vermelha

Diante da descompensação aguda, Benício é levado para a sala vermelha. Ali, sofre a primeira parada cardíaca durante a preparação para intubação.

Manobras avançadas de reanimação são iniciadas.


23h30 — transferência para UTI

O menino é encaminhado à UTI já intubado, instável e com saturação baixa.

Na UTI, a equipe médica prescreve corretamente adrenalina por nebulização, registrando segundo protocolo.

Esse detalhe é fundamental para a investigação.

A família afirma:

“O sistema registrou normalmente a prescrição correta na UTI. Então por que teria alterado só antes?”


23 de novembro — madrugada crítica

00h00 a 02h45 — seis paradas cardíacas

Entre meia-noite e 02h45, Benício sofre seis episódios de parada cardíaca.

Equipes revezam:

  • massagem cardíaca,
  • drogas vasoativas,
  • ventilação mecânica.

O quadro cardiocirculatório não se estabiliza.


02h55 — óbito confirmado

O menino morre às 2h55 do dia 23 de novembro.


Após a morte: início das suspeitas

Segundo o delegado Marcelo Martins, testemunhas relataram que, após o óbito, a médica:

“Tentou obter acesso à prescrição original para suprimi-la e editar os dados no sistema.”

Três depoimentos confirmam a tentativa de alterar o prontuário.

“Temos três testemunhas que indicaram essa situação”, afirmou o delegado.

Esses relatos indicam uma possível tentativa de ocultar o erro de via de administração.


Delegado afirma que adulteração agravaria a pena

Marcelo Martins explicou que, caso confirmada, a tentativa de adulteração é um elemento gravíssimo:

“Adulteração de provas é causa forte de pedido de prisão.”

Entretanto, uma liminar em Habeas Corpus impede qualquer pedido preventivo:

“Se não fosse esse Habeas Corpus, seria possível decretar prisão preventiva, pois a adulteração é uma causa forte. Mas com a liminar, está vetada qualquer segregação de liberdade.”


1º e 2 de dezembro — depoimentos derrubam versões

O médico Enryko Garcia confirma ter trocado mensagens com Juliana no dia da fatalidade. Ela pediu ajuda.

O enfermeiro Tairo Maciel confirma que a técnica de enfermagem atuou sozinha no atendimento, contrariando o relato inicial da médica.

Seis outros profissionais — incluindo enfermeiros e médicos da UTI — também são ouvidos.

Os pais de Benício confirmam informações e rebatem a tese de falha do sistema.


Família nega falha do software

Em carta pública, eles afirmam:

“Está demonstrado que não houve falha de sistema. O próprio prontuário registra que, horas depois, a equipe prescreveu corretamente adrenalina por via inalatória. O software funciona.”


Investigação: homicídio doloso qualificado

O delegado conduz o inquérito sob a tipificação de homicídio doloso qualificado, considerando inclusive:

  • dolo eventual,
  • crueldade.

“Estamos avaliando se houve dolo eventual ou homicídio culposo, e até que ponto ações ou omissões culminaram na morte”.


CREMAM abre processo ético

O Conselho Regional de Medicina do Amazonas abre procedimento sigiloso contra a médica.

O hospital afastou Juliana e a técnica Raiza.


Situação atual

  • ambas respondem em liberdade,
  • aguardam conclusão de perícia técnica do sistema,
  • inquérito segue com novas oitivas.

A investigação concentra-se agora em dois pontos centrais:

  1. Erro de prescrição com consequências fatais.
  2. Tentativa de ocultação de provas após a morte.

A linha do tempo revela uma sucessão de eventos que passaram:

  • de um quadro clínico simples,
  • para uma piora brutal,
  • até o desfecho trágico com morte após múltiplas paradas cardíacas.

O delegado resume:

“Tentamos estabelecer se houve apenas erro ou indiferença ao risco. A morte ocorreu após a prescrição equivocada. E os relatos indicam tentativa de suprimir o registro. Isso pode alterar completamente o enquadramento jurídico.”

A família aguarda respostas.

O país também.

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